António Lobo Antunes e os olhos lacrimejantes
Leio uma entrevista, em jeito de digressão, a António Lobo Antunes. As palavras dele mexem-me sempre nas células, desarranjam-nas. Incomodam-me como o andar à chuva do Alberto Caeiro. E, às vezes, como poucos o conseguem, desarma-me. As palavras dele. Expõem, com crueza, o que anda tão escondido, que ainda não se sabe e já existe. Desta vez, expôs o medo da vida que se esgota antes que o corpo se torne exangue. O medo que já não haja livros para escrever ainda antes de morrer. É um medo imenso. É uma tragédia. E molha-me os olhos com uma tristeza incomensurável. Mas enquanto ele ainda se lembra de dizer
Tenho medo é que isto [a necessidade de escrever livros] acabe antes de eu acabar.
o medo não tem ainda espaço para se materializar. E só interessam as minhas lágrimas felizes de compreensão.