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Recomendações 84

Our man in Tehran

Um conjunto de vídeos informativos, esclarecedores, elegantes e jornalisticamente neutros sobre situações na vida de pessoas no Irão, da autoria de Thomas Erdbrink e Roel Van Broekhove, que recomendo vivamente. Desde uma percepção de grupo pouco inquisitiva sobre a escassez de água no caudal de um rio à possibilidade de uma “justiça” assente numa premissa de “olho por olho”, mas só quando não há mulheres envolvidas, os vídeos exploram episodicamente a visão de pessoas iranianas numa sociedade que querem, ou não, mudar. 
Obrigada, L., pela partilha!

Pensamentos líquidos 120

A crueldade dos seres II - a cobardia de alguns

Os recentes ataques reivindicados pelo DAESH, pelo Boko Haram e por outros grupos bélicos jihadistas, em várias partes do globo, voltaram a mostrar o mais puro desrespeito pela vida humana. 
No dia 20 de setembro, um conjunto de ataques no nordeste da Nigéria, em Maiduguri e em Monguno, causou a morte de 145 pessoas e feriu cerca de 120. Os atacantes fizeram explodir várias bombas, numa mesquita, num mercado, num centro desportivo e num check point. As pessoas, que viviam a sua vida pacificamente, foram brutalmente assassinadas e feridas.
No dia 12 de novembro, num ataque devastador em Beirute, 43 pessoas morreram e cerca de duas centenas ficaram feridas. Estas pessoas estavam perto de uma mesquita e de uma padaria. E foram brutalmente assassinadas e feridas. 
No dia 13 de novembro, noutro ataque devastador, em Paris, assassinaram 130 pessoas e feriram mais de 350. Todos os locais de ataque foram locais de lazer. E eu posso estar completamente enganada, mas eu considero que isso foi propositado, considero que foi um atentado a uma forma de vida. Também posso estar enganada, mas também me parece que o ataque perto do Stade de France tinha como objetivo fazer muitas vítimas. Novamente, as pessoas foram brutalmente assassinadas e feridas.
No dia 21 de novembro, um grupo armado fez refém dezenas de pessoas num hotel em Bamako, no Mali, acabando por matar 20 pessoas. Parece haver muitas questões ainda por responder, mas também aqui estas pessoas foram brutalmente assassinadas.
No dia 25 de novembro, houve um ataque à guarda presidencial tunisina, em Túnis, na Tunísia. Morreram 12 pessoas, num ataque também reivindicado pelo DAESH. E a conclusão não difere: estas pessoas foram brutalmente assassinadas.
Eu gostava de dissertar sobre várias facetas deste movimentos mas, por hoje, quero centrar-me apenas na crueldade, na violência. Em qualquer destes casos, morreram pessoas. Pessoas cujas vidas poderiam ser mais longas foram privadas de tempo que era delas. Pessoas que foram assassinadas. Eu poderia escrever inocentes que foram assassinados. E estaria certa. Como é que alguém, que tenha um resquício de respeito pelo valor da vida humana, pode achar que pode privar outrem do seu tempo de vida?

É a crueldade derradeira. E é indesculpável.

Pensamentos líquidos 118

Carta aberta a Luaty Beirão


Luaty, Henrique, Ikonoklasta,

Não sei como te chamar. Espero que não te desagrade que eu tente várias opções. É importante para mim poder chamar-te aquilo que gostas que te chamem.

Não nos conhecemos, por isso espero que não sintas que estou a invadir a tua intimidade ao escrever-te uma carta aberta. Achei fundamentar fazê-lo. Ao contrário de ti, não sou destemida para me colocar em perigo por uma causa. Mas tento utilizar a palavra como a arma mais forte que tenho. E gostava muito que pudesses ler estas palavras; gostava muito que estas palavras ecoassem nos planos políticos e reverberassem o suficiente para ajudar na mudança para a qual estás a contribuir.

Só posso imaginar a debilidade, a dor, que não comer te traz e o sacrifício que fazes para lutar. Mas, nessa debilidade física, todos vemos a tua força. E, por isso, peço-te, mesmo não tendo o direito de o fazer. Não deixes que te matem. A tua vida importa tanto e a tua morte deixaria um vazio infindável. A tua morte não traria a mudança que queres. Porque a tua força só pode continuar se estiveres vivo.

Por isso, vive. Vive. Por favor, vive. Porque somos nós quem te deve a ajuda possível na luta que travas. Mas não te podemos substituir na luta. Conseguiste, com essa privação imensa que passas, trazer os abusos do regime do Presidente José Eduardo dos Santos às televisões. Conseguiste que não nos esquecêssemos do que acontece em Angola; conseguiste que a imprensa, que se interessa por um tema pouco mais do que uma criança se interessa por um brinquedo antigo quando recebeu de presente um brinquedo novo, não ignorasse o que se passa em Angola. Conseguiste que discutissem novamente como uma democracia não é uma democracia só porque se chama assim. Conseguiste fazer-nos lembrar que uma democracia requer que a pluralidade de opiniões possa ser dita. Mesmo quando as Constituições o esquecem. 

Conseguiste lembrar-nos que o esforço também traz recompensa e que interessa lutar, mesmo quando o preço é demasiado alto. Conseguiste tanto. Conseguiste tanto. Mas é tempo de deixares que também lutem por ti. Só podes conseguir mais se te fortaleceres fisicamente. Bem sei, bem sei, que isso desinteressaria a maior parte daqueles que agora se interessam, daqueles que agora fingem interessar-se. Mas é tempo que outros lutem por ti. 

Sim, não tenho direito de te pedir coisa alguma. Não tenho direito, do conforto da minha casa, do conforto da distância ao regime, do conforto de quem pode escrever e manifestar-se, de te pedir coisa alguma. E, ainda assim. Peço-te: não deixes que te matem. A tua vida vale tanto. Deixa que agora outros lutem por ti, lutem contigo, lutem convosco. Porque também sei que não estás só. 

Não temos o direito de te desiludir. 

Sei que é incipiente. Sei que é nada. Mas vou tentar utilizar as minhas palavras para te ajudar.

Fica saudável.


Rita


Se quiserem assinar a petição da Amnistia Internacional - Portugal para a libertação dos prisioneiros políticos em Angola, podem fazê-lo aqui.

Pensamentos líquidos 116

Os assassinos do Boko Haram

Continua a ser tempo de indignação. E é tempo (ainda que tardio) de se fazer alguma coisa. Leiam o relatório da Amnistia Internacional ou esta notícia do Público sobre o que o Boko Haram continua a fazer na Nigéria e interiorizem a violência que está a ser permitida.
Mas não quero deixar de copiar alguns parágrafos do relatório da Amnistia. As palavras são poderosas e podem chocar o suficiente para estimular a indignação e, mais importante ainda, a ação.
«A man in his fifties told Amnesty International what happened in Baga during the attack: “They killed so many people. I saw maybe around 100 killed at that time in Baga. I ran to the bush. As we were running, they were shooting and killing.” He hid in the bush and was later discovered by Boko Haram fighters, who detained him in Doron Baga for four days.
Those who fled describe seeing many more corpses in the bush. “I don’t know how many but there were bodies everywhere we looked,” one woman told Amnesty International.
Another witness described how Boko Haram were shooting indiscriminately killing even small children and a woman who was in labour. “[H]alf of the baby boy is out and she died like this,” he said.»

Devemos ficar indignados. As pessoas sofrem. As pessoas morrem. E é tempo de se fazer alguma coisa.

Pensamentos líquidos 115

Je suis Charlie aussi

Nos últimos dias, após o ataque às pessoas que trabalhavam para o Charlie Hebdo e a sequência posterior de eventos, houve uma indignação generalizada do mundo. Houve uma indignação contra a violência e contra o ataque à liberdade de expressão. E esta é, para mim, uma indignação válida. Pode não ser indignação suficiente, mas é válida.
Muito se tem falado e escrito sobre o ataque. Mas no meio de tanta tinta, parece-me ter sido um pouco negligenciado o que estes ataques significam, para além de pura e malevolente crueldade. Estes ataques significam medo de quem questiona. Medo do esclarecimento. Medo da consciência. Não quero, como pessoa convictamente ateia que sou, fazer uma crítica generalizada à religião. Até porque isso seria, naturalmente, idiota. Também não quero entrar nas questões filosoficamente relevantes porque, bem... tiraria o foco deste texto. Quero apenas dizer que a religião míope praticada por essas pessoas que se dizem fieis, mas andam por aí a matar outros, cresce e prolifera muito mais facilmente na ignorância. Na ausência de sentido crítico. E os cartoons significavam essa necessidade de não aceitar sem questionar. Eu espero que com esta indignação (re-)nasça um novo movimento pelo esclarecimento, pelo conhecimento. Que, na verdade, já tem uma madrinha tão nobre na Malala.
Muito se tem falado e escrito sobre o ataque. E no meio de tanta tinta, parece-me haver alguns excessos. Para algumas pessoas, a indignação tem sido desproporcionada porque não encontrou igual noutros casos igualmente repudiáveis. Eu acho que não devemos ficar indignados com a indignação legítima contra a crueldade, contra a violência gratuita, contra a ignorância. Devemos, sim, ficar muito, mas mesmo muito, indignados quando Assad e o Estado Islâmico continuam a matar pessoas, mais ou menos indiscriminadamente, e ninguém se indigna. Devemos ficar indignados quando a Rússia mata ucranianos na Crimeia e meio mundo olha para o lado. Devemos ficar indignados quando violam mulheres na Índia e saem impunes. Devemos ficar indignados com os ataques israelitas aos palestinianos em Gaza. Devemos ficar indignados com os raptos do Boko Haram. Devemos ficar indignados. As pessoas sofrem. As pessoas morrem.
As pessoas morrem... E muitos esquecem. Sim, devemos ficar indignados com isso. Não com a indignação do que indigna.

Pela indignação


Eddie Vedder e Paulo Furtado, cover de Masters of War, de Bob Dylan

Homenagens 63

Objector de consciência

Jovem, que se recusa participar na exército israelita devido aos seus actos violentos contra o povo palestiniano, é sistematicamente preso pelas autoridades israelitas. São pessoas assim que me lembram por que é que é preciso lutar.

Conscript facing jail again for refusing to go against his conscience | Amnesty International

Pensamentos líquidos 106

Número de reclusos nos EUA

É “natural” que, num estado de direito, quem cometa uma ofensa criminal grave seja privado da sua liberdade durante um período de tempo. Foi o modo acordado para lidar com ofensas sérias aos direitos de outros. E, julgo, faz sentido. Se por um lado, há que haver um conjunto de regras que estipule o que é e não permitido a uma vida em sociedade, por outro, há que haver um modo de as tornar efectivas. Adicionalmente, quando alguém põe em perigo a vida em sociedade (e a vida de outros em particular) de um modo de tal forma grave que se considera não ser prudente deixá-lo livre, então, julgo, faz sentido, restringir as acções dessa pessoa, designadamente através da sua prisão. Mas não faz sentido encarcerar pessoas que cometem pequenos delitos só porque politicamente se querer mostrar quão duro se é contra o “crime”. E muito menos faz sentido fazer cumprir uma pena ilógica. Leiam, a este propósito, este artigo no Economist sobre o número de reclusos nos EUA. Chamo a atenção, em particular, para o primeiro parágrafo que seria hilariante de tão ridículo, se não se estivesse a falar de privar pessoas da sua liberdade física.


«IN 2000 four Americans were charged with importing lobster tails in plastic bags rather than cardboard boxes, in violation of a Honduran regulation that Honduras no longer enforces. They had fallen foul of the Lacey Act, which bars Americans from breaking foreign rules when hunting or fishing. The original intent was to prevent Americans from, say, poaching elephants in Kenya. But it has been interpreted to mean that they must abide by every footling wildlife regulation on Earth. The lobstermen had no idea they were breaking the law. Yet three of them got eight years apiece. Two are still in jail.»
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The Economist, artigo supra-referido
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Pensamentos líquidos 105

Dalai Lama e Obama

Ao contrário do que já aconteceu em Portugal, com a solução estranha de Sampaio, Obama vai mesmo receber, na Casa Branca, o Dalai Lama. Pode ser simbólico, mas é importante e não é cobarde. É uma iniciativa que não esquece que o Tibete foi invadido pela China. Independentemente de ter um líder religioso, o que é discutível. Mas a verdade, verdade, é que era uma nação independente e pacífica, com um líder aceite pela população. E, muito sinceramente, alguém com uma filosofia de vida correcta e respeitadora.
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Fico muito satisfeita com este encontro: é simbólico, sim, mas é uma esperança.
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Pensamentos líquidos 101

Escolha no Irão: ousar ou morrer.

Lembram-se das manifestações no Irão, aquando dos resultados das "eleições" que, alegadamente, reconduziram d'Ahmadinejad no cargo de presidente da “república”? Estão a ser punidas já, para além das encarcerações. Ali-Zamani, um dos manifestantes, foi hoje condenado à morte por um “tribunal” iraniano. Notícias aqui, aqui ou aqui.
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Pensamentos líquidos 100

Outrageous

Mais uma activista russa assassinada: Natalya Estemirova. Eu acho que é altura de se fazer qualquer coisa nestes regimes totalitaristas nos quais se assassina todas as pessoas que dizem coisas que são inconvenientes.

It’s time for the UN to really step up.
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Pensamentos líquidos 98

Obama’s speech in Cairo

Pode ser um discurso cheio de Deus, de deuses, de religião, de religiões. Pode ser um discurso que, como já li, não faz a verdadeira separação entre o Estado e a religião. Pode ser um discurso cheio de citações de textos religiosos.

Podia ser um discurso falhado. Mas não foi. Foi um discurso brilhante.

O que o tornou um discurso brilhante (claro, é uma opinião pessoal) foram as regras básicas do discurso e uma capacidade notável de as pôr em prática, de escolher as palavras certas, as frases apelativas, a retórica apropriada.

Este tornou-se um discurso muito esperado, o discurso “decisivo”. Não podia ser um discurso agressivo, intolerante, mas também não podia ser cobarde, escamoteado. E o Obama e a sua equipa conseguiram um equilíbrio admirável no texto.

Um discurso serve para transmitir ideias. Mas só produz efeitos se a audiência tiver interesse na mensagem. Por isso é que Obama citou com frequência textos religiosos: porque ele precisava de conseguir o interesse da audiência na mensagem. E a audiência era composta fundamentalmente de pessoas religiosas. Quer me agrade ou não, quer partilhe os princípios ou não, eu não vou falar dos glaciares às pessoas do Sahara quando quero que elas embarquem comigo numa viagem por um objectivo comum. Vou falar-lhe dos interesses e preocupações comuns. Vou tentar criar afinidade.

Acho que todos temos que nos lembrar que Obama estava em território hostil. Hostil porque, depois dos últimos anos, é demasiado fácil criticar os EUA. Hostil por causa da relação dos EUA e de Israel. Hostil pela dificuldade que é limpar uma imagem.

E, na minha opinião, Obama conseguiu ultrapassar isso sem abdicar dos pontos fundamentais. Não é por suportar a causa de um Estado palestiniano que deixou de condenar os ataques suicidas. Não é porque o que aconteceu a seguir foi errado, que deixou de relembrar a tragédia do 11 de Setembro. E o fundamental aqui foi (e será sempre) o respeito pelos direitos humanos. E ele conseguiu transmitir isso, seja na maneira subtil como introduziu o respeito pela escolha, seja no modo como falou do direito a viver sem ter um alvo na testa.

Eu sei. Eu sei. Tenho uma simpatia grande por ele. E pelo rapaz que escreve os discursos, se bem que dizem que o próprio Obama trabalhou bastante neste. Mas leiam o discurso. Leiam-no, tendo em mente o objectivo, tendo em mente o passado pesado que os EUA têm em relação ao mundo árabe. Leiam-no e deixem-se inebriar se for esse o caso. Eu li-o assim e se o Obama me aparecesse aqui enquanto o lia e me dissesse que o mundo ia mesmo ser um mundo melhor, eu achava que o Alberto Caeiro estava errado e que feliz seria eu e todos os que vivem a vida a querer inventar a máquina de fazer felicidade.


Uns excertos

«Of course, recognising our common humanity is only the beginning of our task. Words alone cannot meet the needs of our people. These needs will be met only if we act boldly in the years ahead; and if we understand that the challenges we face are shared, and our failure to meet them will hurt us all.

For we have learned from recent experience that when a financial system weakens in one country, prosperity is hurt everywhere. When a new flu infects one human being, all are at risk. When one nation pursues a nuclear weapon, the risk of nuclear attack rises for all nations. When violent extremists operate in one stretch of mountains, people are endangered across an ocean. And when innocents in Bosnia and Darfur are slaughtered, that is a stain on our collective conscience. That is what it means to share this world in the 21st century. That is the responsibility we have to one another as human beings.

This is a difficult responsibility to embrace. For human history has often been a record of nations and tribes subjugating one another to serve their own interests. Yet in this new age, such attitudes are self-defeating. Given our interdependence, any world order that elevates one nation or group of people over another will inevitably fail. So whatever we think of the past, we must not be prisoners of it. Our problems must be dealt with through partnership; progress must be shared.

That does not mean we should ignore sources of tension. Indeed, it suggests the opposite: we must face these tensions squarely.
(…)
The issues that I have described will not be easy to address. But we have a responsibility to join together on behalf of the world we seek – a world where extremists no longer threaten our people, and American troops have come home; a world where Israelis and Palestinians are each secure in a state of their own, and nuclear energy is used for peaceful purposes; a world where governments serve their citizens, and the rights of all God's children are respected. Those are mutual interests. That is the world we seek. But we can only achieve it together.

I know there are many – Muslim and non-Muslim – who question whether we can forge this new beginning. Some are eager to stoke the flames of division, and to stand in the way of progress. Some suggest that it isn't worth the effort – that we are fated to disagree, and civilisations are doomed to clash. Many more are simply skeptical that real change can occur. There is so much fear, so much mistrust. But if we choose to be bound by the past, we will never move forward. And I want to particularly say this to young people of every faith, in every country – you, more than anyone, have the ability to remake this world.

All of us share this world for but a brief moment in time. The question is whether we spend that time focused on what pushes us apart, or whether we commit ourselves to an effort – a sustained effort _ to find common ground, to focus on the future we seek for our children, and to respect the dignity of all human beings.

It is easier to start wars than to end them. It is easier to blame others than to look inward; to see what is different about someone than to find the things we share. But we should choose the right path, not just the easy path. There is also one rule that lies at the heart of every religion – that we do unto others as we would have them do unto us. This truth transcends nations and peoples – a belief that isn't new; that isn't black or white or brown; that isn't Christian, or Muslim or Jew. It's a belief that pulsed in the cradle of civilisation, and that still beats in the heart of billions. It's a faith in other people, and it's what brought me here today.

We have the power to make the world we seek, but only if we have the courage to make a new beginning, keeping in mind what has been written.»
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Pensamentos líquidos 97

Exposição: pensamentos sobre activismo (social) e qualidade de vida individual

Estava a ver o Milk e comecei a ter um conjunto de pensamentos na minha cabeça que precisava de ser escrito. Um conjunto de pensamentos emaranhado que, no entanto, apresentava convicções muito fortes. E quando reparei tinha páginas de parágrafos desconexos, cheios de intensidade, mas pouca coerência. A incoerência devia-se provavelmente a duas coisas: primeiro, não conseguia parar de chorar enquanto escrevia e segundo, a minha mente não funciona linearmente.

Tentei uma depuração, mas precisava tanto de gritar estas ideias. Tanto. Se escrevesse este texto há alguns (poucos) anos atrás, escrevê-lo-ia certamente de um ponto de vista diferente. Mas não hoje, não agora, quando as minhas ideias estão mais inseguras, mas algumas das minhas convicções mais fortes do que nunca.

E por isso vou aproveitar para dedicar este texto a algumas pessoas. Primeiro e acima de tudo, às pessoas que nunca abdicaram de mim por nenhum bem maior ou por egoísmo e segundo às pessoas que conheço e para quem sei que a luta do Milk foi importante.



Começando pelo Milk. A jeito de “sinopsear” o filme, Harvey Milk é um activista dos direitos dos homossexuais e torna-se político, tendo os direitos dos homossexuais como a prioridade da sua “agenda”. E é assassinado. Enquanto Milk luta pela defesa dos direitos dos homossexuais negligencia a relação com o seu companheiro. Destrói a relação com a pessoa de quem gosta, que por acaso é um homem. E se, por um lado, a sua luta é tão meritória que não devia sequer existir, por outro, é tão triste que simultaneamente inviabilize a possibilidade de usufruir de eventuais ganhos dessa luta. A luta social que encetou prejudicou-o e prejudicou a outra pessoa que mais interesse também teria nessa luta – o seu companheiro 1.

Porquanto Milk não quis ser assassinado e não “escolheu” sê-lo, escolheu continuar a luta em favor da sociedade em detrimento de escolher o seu companheiro. E isto é uma merda. Muito sinceramente, da maneira como eu agora vejo isto, ele tinha as prioridades trocadas. E, no entanto, para as outras pessoas que beneficiaram da sua luta, do seu comportamento, a vida melhorou. E, no entanto, eu admiro a sua luta tremendamente. Mas só porque não sou o Scotty.


Em geral, viver uma vida é uma coisa complicada e difícil. Pelo menos quando se pensa um bocadinho nela. E tudo piora muito quando as pessoas de quem se gosta abdicam de nós por um “bem maior”. Pois bem, a minha tese é que não há bem maior.

A “sociedade” impacta a vida de cada indivíduo de maneiras que, por vezes, parecem indiciar que não é sequer composta também por esses indivíduos. De facto, em “sociedades ideais”, não deveria haver impactos em liberdades individuais pela força “externa” da sociedade. Como não deveria haver violações de direitos humanos. Mas há. E são estes impactos que requerem que se continue a lutar. A lutar por direitos e a lutar por liberdades. E portanto a promover este activismo social.

Mas pelo bem de cada indivíduo activista e de todos os que lhes são próximos, não se deve achar que há um bem maior que merece todos os sacrifícios. A maior parte dos activistas de que me lembro, mesmo garantindo a melhoria de condições de vida para alguns indivíduos, tiveram a sua vida pessoal arruinada. E não me refiro só aos que foram assassinados.

Por isso e só para evitar equívocos: eu não estou a dizer que não se deve lutar. Pelo contrário: deve lutar-se até ao limite possível, mas não se deve chegar à “martirização” da luta ou da causa, mesmo quando válida. E por isso é que é importante ter grupos civis que funcionem como lobbies ao poder político. Por isso é que é importante garantir que as pessoas têm liberdade para promover essa luta. Por isso é que é importante que todas as pessoas que acreditam que algumas coisas estão mal façam qualquer coisa. Porque se fizerem, haverá menos mártires não intencionais.

A garantia da prevalência de direitos humanos e de liberdades individuais é tão importante como a garantia do respeito pela vida. E isto porque viver uma vida é muito mais do que sobrevivê-la. É saber que se pode gostar de um rapaz ou de uma rapariga e não haver nada de errado nisso. É saber que não há KKKs a incendiarem casas e a matarem pessoas. É saber que um muçulmano aceita um cristão, um cristão aceita um muçulmano e que ambos aceitam ateus.

De cada vez que, em Portugal, me encontro com amigos homossexuais em sítios públicos e percebo que não se sentem sequer confortáveis em ter manifestações normais de afecto, tenho vontade de bater às pessoas que estão por perto. Porque não devia ser assim. E por isto, sim, eu devo lutar. Todos vocês devem lutar. Quando uma coisa ridícula como casar não é permitido a alguém só pelo sexo das pessoas; sim, deve lutar-se.

Esta é a minha pequena tentativa activista. Um dos meus gritos como os banners ali na barra de lado. Mas é também a minha tentativa de dizer que o activismo só vale a pena porquanto permite viver melhor. E ser morto por isso (à excepção de quem, legitimamente, acha que essa também é uma via) em geral não vale a pena.

Porque se o activismo normalmente tem inerente características sociais (pelo menos no que eu me quero referir aqui), é sempre verdade que a sociedade é composta por indivíduos. E por muito que às vezes me digam que o todo é maior do que a soma das partes, eu vou continuar a achar que o todo será sempre menor do que um indivíduo que seja. E eu não acho que haja um bem maior na sociedade, per se. Mas há um bem muito maior em cada indivíduo de cada sociedade.

Por isso deixa-me muito contente sempre que cada pessoa dentro “da sociedade” pode fazer algo que a deixa um bocadinho, um bocadinho que seja, mais feliz por causa de um objectivo atingido na luta pela garantia de direitos humanos e de liberdades individuais.

E ainda assim. Há uma angústia terrível que não me abandona. Há uma angústia terrível porque penso em todos os activistas mortos. Em todos os activistas que, ainda que garantindo a melhoria de condições de vida para alguns indivíduos, tiveram a sua vida pessoal arruinada.

Choro. Choro pela injustiça. De todos os casos que aconteceram. E porque sei que vai continuar a acontecer.


1 Para garantir a veracidade das coisas, note-se que esta visão só é abordada no filme na segunda relação de Milk. E eu escrevi o texto antes de ver essa parte do filme, portanto refiro-me à primeira relação retratada no filme.
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Grito 4

O que a guerra faz às pessoas

Uma pessoa disse-me há pouco tempo que não se pode ajudar toda a gente. E tinha razão. Mas pode ajudar-se algumas pessoas.
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Choque

Em Moçambique, a esperança média de vida é inferior a 40 anos.
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Grito 3

«Na primeira pessoa Omer Goldman

Ela tem 19 anos. Regressa hoje a uma base militar para um terceiro ciclo de 21 dias de detenção. Recusa-se a servir num "exército de ocupação".»

Leiam a edição impressa do Público de dia 05 de Novembro. Leiam a experiência de uma rapariga que não aceitou só o que lhe diziam ser certo e duvidou. Leiam como a força às vezes pode fazer diferenças. Leiam-na.

E, eventualmente. Se quiserem. Escrevam-lhe.

«Ficarei muito feliz se me escreverem. A minha morada nos próximos dias é esta:
Omer Granot
Military ID 5398532
Military Prison nº 400
Military Postal Code 02447, IDF
Israel»

Grito 1

Mulher, "acusada" de adultério, lapidada na Somália

Um dia depois de me terem dito uma coisa tão inesperada e respeitadora dos direitos humanos no Níger, leio isto sobre as mílicias Somalis. Deve ser para me lembrar que não se deve incentivar a esperança.
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Pensamentos líquidos 86

Há alturas em que a revolta é positiva

Vinha, de Frankfurt para Lisboa, a ler a Economist de há umas semanas atrás. E fiquei boquiaberta de choque, de revolta, de despeito durante minutos que não soube contar. Mas dentro da minha revolta houve um contentamento por eu não ser (não ser ainda, talvez) indiferente. Enquanto não se é indiferente, pode fazer-se muito. Coisas pequenas, talvez, mas fazer-se ainda. Se nada do que vou transcrever aqui é novo, a revolta a cada vez que episódios deste acontecem devia ser nova. E maior. Ruidosa.

Exactamente por não me sentir indiferente, decidi transcrever o artigo todo. À mão. Para não me esquecer do que li tão depressa. E para indignar todas as pessoas que visitarem este post. Devo avisar que o artigo é chocante. Nada de novo, é certo. Mas não sejam indiferentes.

«Atrocities beyond words

A barbarous campaign of rape

Everything in the Democratic Republic of Congo, a country almost the size of western Europe, is on a scarcely imaginable scale – including the violence. Among the most beautiful mountain vistas, terraced hillsides and lush tropical greens of eastern Congo, a bitter, decade-long civil war that officially ended in the rest of the country in 2003, and that has claimed several million lives as a result of fighting and disease, burns on in the eastern border provinces of Ituri, North Kivu and South Kivu. A ceasefire signed in the town of Goma in January between the government and more than a score of militias has so far done little to ease the plight of civilians in the east. All sides – government troops, says the United Nations, as well as the militias – continue to use rape as a weapon of war on a barbarous scale.

Most victims, as ever, are women and girls, some no more than toddlers, though men and boys have sometimes been targeted too. Local aid workers and UN reporters tell of gang rapes, leaving victims with appalling physical and psychological injuries; rapes committed in front of families or whole communities; male relatives forced at gunpoint to rape their own daughters, mothers or sisters; women used as sex slaves forced to eat excrement or the flesh of murdered relatives. Some women victims have themselves been murdered by bullets fired from a gun barrel shoved into their vagina. Some men, says a worker for the UNs Children Fund (Unicef), have been forced to simulate having sex in holes dug in the ground, with razor blades stuck inside.

Sometimes the motive is revenge for attacks by rival militias, sometimes it is ethnic cleansing and on other occasions an effort to undermine the morale of the enemy by spreading shame, injury and disease. The trauma and appalling injury suffered by women and men who survive such assaults cripple families and whole villages. Is eastern Congo up to 80% of reported fistula cases in women are thought to result from rape attacks. The epidemic of violence also spreads HIV/AIDS.

According to a report published in October by the UN secretary-general in an effort to get governments to do more to protect civilians caught up in this and another conflicts, in the first six months of 2007 there were 4 500 cases of sexual violence reported in South Kivu alone. As a rule of thumb in such situations, says the UN, for every rape that is reported, as many as ten or 20 cases may go unreported.

Rape in warfare is nothing new. Congo has long had a culture of violence and an almost non-existent judicial system. Though rape is supposedly illegal, often it is the victim who is shunned. Neither army nor militia commanders seem to see rape as a serious offence and so take no action against their marauding soldiers. Some fighters are said to believe that the rape of a virgin bestows invincibility in combat. But these are not random acts by misguided or crazed individuals, says the UN; they are a deliberate attempt to dehumanise and destroy entire communities.

(…)

The idea is to draw world attention to the plight of civilians, whose suffering is at least as extreme as anything witnessed in the better-publicised conflict in Sudan’s western region of Darfur. The hope is that outside governments, the African Union, the European Union and the United States may offer political and financial support. Since all UN members have promised to observe a fundamental “responsibility to protect” their citizens from war crimes and crimes against humanity, focusing world attention on such crimes in eastern Congo is perhaps the least outsiders can do.»

Versão impressa da Economist, 3 Maio

Pensamentos líquidos 85

“Black America”

Felizmente nem todos têm uma mente tão pré-concebida como o Sr. Watson. Vejam aqui um artigo giríssimo sobre as diferenças (e seus motivos) entre os African-American e os Latinos ou American. E como essas (não) diferenças se reflectem, por exemplo, nas remunerações.


[via Economist]

Pensamentos líquidos 83

Sobre o preço dos cereais

«In Haiti, protesters chanting “We’re hungry” forced the prime minister to resign; 24 people were killed in riots in Cameroon; Egypt’s president ordered the army to start baking bread; the Philippines made hoarding rice punishable by life imprisonment.
(…)
The prices mainly reflect changes in demand – not problems of supply, such as harvest failure. The changes include the gentle upward pressure from people in China and India eating more grain and meat as they grow rich and the sudden voracious appetites of western biofuels, which convert cereals into fuel. This year the share of the maize (corn) crop going into ethanol in America has risen and the European Union is implementing its own biofuels targets. To make matters worse, more febrile behaviour seems to be influencing markets: export quotas by large grain producers, money from hedge funds looking for new markets.
(…)
Usually, a food crisis is clear and localised. The harvest fails, often because of war or strife, and the burden in the affected region falls heavily on the poorest. This crisis is different. It is occurring in many countries simultaneously, the first time that has happened since the early 1970s. And it is affecting people usually not hit by famines.
(…)
But by almost any measure, the human suffering is likely to be vast. In El Salvador the poor are eating only half as much food as they were a year ago. Afghans are now appending half their income on food, up from a tenth in 2006.»

From Economist’s briefing “Food and the poor”, April 19th
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Homenagens 29

Xutos e Oioai - Pertencer