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Apontamentos fugazes 241

Moral

Estou farta que me digam que tenho razão. Quero que ajam de acordo com essa razão. Mas não posso esperar esse dia. Não quero criar expectativas irrealistas.

Apontamentos fugazes 240

Comunicação

E não é que Nietzsche já tinha pensado a pirâmide da compatibilidade, expressa em termos de comunicação?

Pressupondo que, desde sempre, a necessidade apenas aproximou aqueles homens que, servindo-se de sinais semelhantes, podiam indicar necessidades semelhantes e experiências semelhantes, resulta daí, em geral, que a fácil comunicabilidade da necessidade (…) deve ter sido a coisa mais poderosa entre todas as que, até ao presente, dominaram o homem. Os homens mais parecidos e mais vulgares estiveram e estão sempre em vantagem; os mais selectos, mais delicados, mais raros, mais difíceis de compreender permanecem facilmente sós, sucumbem, com o seu isolamento, aos acidentes e reproduzem-se pouco. Devemos invocar forças contrárias monstruosas para entravar este processo natural, demasiado natural (…) o avanço do homem no sentido do semelhante, do comum, do mediano, do gregário — do vulgar!

Friedrich Nietzsche, Para além do Bem e do Mal
tr. e notas Carlos Morujão, (Lisboa, Relógio d’Água, 1999), § 268

Apontamentos fugazes 234

Reprodução

Nem todas as coisas aspiram a isso, mas tens razão Aristóteles, essa é a maneira mais comum de aspirar ao eterno e ao divino. Só que nós, nós temos a arte.
É que essa é a função mais natural, para os seres vivos perfeitos — os não mutilados, nem de geração espontânea —, produzir um outro da mesma qualidade da sua: o animal, um animal; a planta, uma planta. Isto para que possam participar do eterno e do divino do modo que for possível; todas as coisas aspiram a isso, e tudo quanto fazem de acordo com a natureza, fazem tendo em vista isso.  
Aristóteles, Sobre a Alma, tr. Ana Maria Lóio, Lisboa, Imprensa Nacional Casa da Moeda, 2010, 415a, 25 a 415b

Apontamentos fugazes 232

E ainda arte. E ainda Rui Chafes.

Quando se prova um chá bom, não se quer voltar a beber qualquer outro. O mesmo acontece com a arte, com a poesia, com a filosofia. É difícil aguentar coisas fraquinhas. 
 
Não se pode levantar o véu de uma obra de arte, deixá-la despida. Como as pessoas não sabem ver, estão sempre à espera de referentes e palavras, para tentarem lá ver o que lhe disserem que «é». 

(…) não há arte sem pensamento, porque sem este é apenas artesanato. (…) a arte, se o é, tem de questionar, inquietar, e perturbar o mundo. Como disse, a arte é para se «ficar mal». 

Rui Chafes, Sob a Pele - conversas com Sara Antónia Matos, Documenta - Cadernos do Atelier-Museu Júlio Pomar, 2015, pp. 71, 144 e 152

Apontamentos fugazes 230

A permanência

A peste, é preciso dizê-lo, tirara a todos o poder do amor e até o da amizade. Porque o amor exige um pouco de futuro e, para nós, já não havia senão instantes. 

Albert Camus, A Peste, 1ª ed., Livros do Brasil, 2016, p. 156

Arquitetura, artes plásticas e design 17

Fugit Amor, por Auguste Rodin

O eco que uma peça de arte reverbera em cada um de nós é variável e depende da relação genuína que se cria entre nós e a peça. Evidentemente, essa relação depende de um conjunto enorme de fatores, de entre os quais tem de se destacar as características intrínsecas da peça e nossas. Outro factor de destaque é a forma de arte em si, que pode, de algum modo, ser vista como uma das características da peça de arte. 
O impacto de uma peça de arte num indivíduo é uma temática que me interessa sobremaneira, mas hoje não é o dia para dissertar sobre ela. Hoje é dia de falar de um caso específico.
Há algumas semanas atrás, no Museu Rodin, em Paris, voltei a ser assaltada por uma sensação de compreensão tão avassaladora que me trouxe lágrimas às comportas dos olhos. Sou uma fã assumida de Rodin há muitos anos porque há uma intensidade nas suas obras que me comove, que me causa um estremecimento de verdade. Causa-me uma sentimento maior. Um tipo único de sentimento maior que só na arte consigo sentir sem receio de desilusão. 
No percurso da sua casa-museu, aparece cedo uma obra que há muito me cativa, me comove, me enternece e me faz exaltar. Chama-se “Fugit Amor” e, como muitas das suas obras, é parte das Portas do Inferno. Vi uma versão em mármore no Museu Legion of Honor em São Francisco há muitos anos atrás e teve também esse impacto magnífico. Várias outras obras na casa-museu em Paris causaram efeito semelhante, mas Fugit Amor é um bocadinho mais especial. 

Como vos dizia, o impacto de uma peça de arte num indivíduo depende de muitos fatores. Em Fugit Amor eu vejo perfeição técnica, mas vejo muito mais, vejo a qualidade efémera de um sentimento que nunca poderá ser permanente, a não ser que seja congelado na morte. Em Fugit Amor eu vejo a impossibilidade de um amor eterno e, no entanto, vejo a intensidade e a dor da sua ausência. Sim, sei que não é essa a história por detrás da sua criação para as Portas do Inferno. Mas é assim que a sinto. E isso é tudo porque em Fugit Amor vejo-me a mim.

Apontamentos fugazes 229

Escrever

Sei que já o repeti mais do que o razoável, mas há qualquer coisa de único quando se escreve. Há um estrépito de tambores decisivos. Que preparam a chegada de algo mais verdadeiro. Da essência que, no momento, se perpetua para sempre. 
E há dias especiais em que, em êxtase, se escreve assim. Há dias em que, em catarse, me escrevo assim. Dias como o de hoje.

Recomendações 82

Brainpickings

Brainpickings, a wonderful website, written by Maria Popova, which touches upon a variety of interesting topics, ranging from philosophy to neuroscience.

Apontamentos fugazes 222

As palavras de todas as explicações

Espero, em utopia, encontrar as palavras de todas as explicações. Como Stephen Hawking procurava encontrar uma equação elegante que tudo explicasse; eu procuro um texto que tudo compreenda, que tudo me explique. Mas independentemente da quantidade lexical, não há semântica que o consiga abarcar.

Homenagens 68

Boyhood, de Richard Linklater

Há muitos filmes. Há alguns que são verdadeiramente bons e verdadeiramente importantes. Mas Boyhood é uma obra-prima. É um épico da condição humana moderna. Que não se coibe de esmiuçar, com uma elegência de um filme francês bom, mas com a intensidade de um filme espanhol, todas as dificuldades e desafios do percurso de cada vida humana. Para chegar à conclusão desarmante de nada ser mais do que uma coleção dos momentos, alguns especiais, mas que fica sempre aquém.

«I thought there would be more.»

Pensamentos líquidos 114

Tédio

Há uns dias atrás, algures ainda no ano passado, escrevi um texto não muito bom sobre tédio. Já algum tempo que queria escrever sobre tédio. Mas o texto que escrevi era, quando muito, medíocre. Curiosamente, não sei onde gravei o texto. Por isso, hoje, decidi escrever novamente sobre tédio.
O tédio é um sentimento humano com o qual me identifico demasiado. Tenho dele consciência nos dias de ligeiro menor stress ou nos dias de irritação com o trabalho. É muito raro sentir tédio fora do local de trabalho. E quando o sinto é normalmente associado a um cansaço excessivo que me leva a um estado estranho de alienação, em que tento tudo para nada fazer.
O tédio é ubíquo. Quando se sente tédio, sente-se em todo o corpo, nos poros; no espaço que nos rodeia. É como uma camada pegajosa dificílima de ultrapassar sem um mind changer. Para mim, a arte pode vencer o tédio. Mas, às vezes, não me permitem a arte. Às vezes, não me desobrigo do tédio.
O tédio é paradoxal I. O conceito de tédio é interessantíssimo de um ponto de vista filosófico. E, todavia, a sua existência, ou melhor, a sua consciencialização é uma agressão ao mais humano que temos. Para mim, a filosofia pode vencer o tédio.
O tédio é paradoxal II. Se, por um lado, é um sentimento muito sufocante de perda de tempo, potencialmente útil para uma atividade ou pensamentos interessantes e portanto não entediantes; é por, outro lado, um momento de consciencialização. E um momento de consciencialização não deveria ser um momento de tédio.
O tédio é angústia. Mas do conceito do tédio nasceu este texto. E eu com tantas saudades de escrever, criei-o. E na escrita, talvez só na escrita, crio autenticidade, crio verdades. E nessa autenticidade da auto-compreensão não há tédio. Nessa autenticidade da escrita – que tanto me foge – eu sou mais eu.
Pois. Talvez não tenha sido mau esquecer-me onde coloquei o texto inicial.

Apontamentos fugazes 220

Não me apetece escrever um título, apetece-me colocar um smile

«Não acabará pois a obsessão do divino? Tanto rio desaguando no mesmo mar. Tanto problema levando à mesma solução. Mas eu quero que os rios se resolvam uns nos outros, que o Mundo seja nosso, que a Terra seja do homem. A palavra que nos queima a boca é uma palavra humana. As questões dos homens resolvem-se entre os homens.»

Vergílio Ferreira, Estrela Polar, 5ª ed., Quetzal, 2011, p. 63

Apontamentos fugazes 217

Camus em Vergílio

«Ser eu em ti, que um filho nos fosse a nós, que alguém nos existisse, não apenas na memória, mas na força total de sermos – tudo isto é verdade e não tem sentido nenhum. Tudo isto é verdade, porque a solidão é tão estúpida… Alucina-me o absurdo como um labirinto, como ser eu nos outros? Ser irredutível e múltiplo? Mas só assim a solidão deixaria de existir. Que me importa transmitir aos outros que dois e dois são quatro ou mesmo o que se passa no fundo de mim? O que eu queria era ser eles quando estão pensando que dois e dois são quatro. O que eu queria é que eles sentissem o que eu sinto e não o que eles sentem. O que eu queria é que eles fossem eu e eu eles, porque só assim é que a “comunicação” tem sentido. Decerto, tudo isto é absurdo – estou farto de o saber. Mas o mais absurdo é o mais humano….»

Vergílio Ferreira, Estrela Polar, 5ª ed., Quetzal, 2011, p. 34

Apontamentos fugazes 216

Perpetuação

«Ah, se tu soubesses como é preciso que eu esteja em ti, que eu não morra, que eu não morra…»

Vergílio Ferreira, Estrela Polar, 5ª ed., Quetzal, 2011, p. 38

Apontamentos fugazes 213


Mito de Sísifo

«Os deuses tinham condenado a Sísifo a empurrar sem descanso um rochedo até ao cume de uma montanha, de onde a pedra caía de novo, em consequência do seu peso. Tinham pensado, com alguma razão, que não há castigo mais terrível do que o trabalho inútil e sem esperança.
(…)
Já todos compreenderam que Sísifo é o herói absurdo. (…) O seu desprezo pelos deuses, o seu ódio à morte e a sua paixão pela vida valeram-lhe esse suplício indizível, em que o seu ser se emprega em nada terminar.
(…)
Se este mito é trágico, é porque o seu herói é consciente (…) O operário de hoje trabalha todos os dias da sua vida nas mesmas tarefas, e esse destino não é menos absurdo. Mas só é trágico nos raros momentos em que ele se torna consciente. Sísifo, proletário dos deuses, impotente e revoltado, conhece toda a extensão da sua miserável condição: é nela que ele pensa durante a sua descida. A clarividência que devia fazer o seu tormento consome ao mesmo tempo a sua vitória. Não há destino que não se transcenda pelo desprezo.»

Albert Camus, Capítulo ‘O Mito de Sísifo’, O mito de Sísifo, trad. de Urbano Tavares Rodrigues, Editora Livros do Brasil, pp. 125, 126, 127

Apontamentos fugazes 194

Absurdo de Camus, escrito por Sartre

«O que é então o absurdo como estado de facto, como dado original? Nada menos do que a relação do homem com o mundo. O absurdo fundamental manifesta, antes de tudo, um divórcio: o divórcio entre as aspirações do homem à unidade e o dualismo intransponível do espírito e da natureza, entre o impulso do homem em direcção ao eterno e o carácter finito da sua existência, entre a “preocupação” que é a sua própria essência e a inutilidade dos seus esforços. A morte, o pluralismo irredutível das verdades e dos seres, a ininteligibilidade do real, o acaso, eis os pólos do absurdo.
(…)
A sua originalidade
[de Camus] é, a seus olhos, ir ao fim das próprias ideias: para ele não se trata, com efeito, de coleccionar máximas pessimistas. Certo é que o absurdo não está no homem, nem no mundo, se os tomamos separadamente; mas, como é o carácter essencial do homem o “estar-no-mundo”, o absurdo é, em suma, unitário com a condição humana.
(…)
Então, se sabemos recusar o socorro enganador das religiões ou das filosofias da existência, temos algumas evidências essenciais: o mundo é um caos, (…) não há amanhã, visto que se morre.
(…)
Mas não é isto somente: é uma paixão do absurdo. O homem absurdo não se suicidará: quer viver, sem abdicar de qualquer das suas certezas, sem dia seguinte, sem esperança, sem ilusões e também sem resignação. O homem absurdo afirma-se na revolta. Fixa a morte com uma atenção apaixonada e esta fascinação liberta-o: conhece a “divina disponibilidade” do condenado à morte. Tudo é permitido, visto que Deus não existe e visto que se morre. Todas as experiências são equivalentes, convém somente adquirir a maior quantidade possível delas.»


Jean-Paul Sartre, prefácio de «O Estrangeiro» de Camus, Livros do Brasil 2006, pp. 8-12

Apontamentos fugazes 191

Função da filosofia

«Science tells us what we can know, but what we can know is little, and if we forget how much we cannot know we become insensitive to many things of very great importance. Theology, on the other hand, induces a dogmatic belief that we have knowledge where in fact we have ignorance, and by doing so generates a kind of impertinent insolence towards the universe. Uncertainty, in the presence of vivid hopes and fears, is painful, but must be endured if we wish to live without the support of comforting fairy tales. It is not good either to forget the questions that philosophy asks, or to persuade ourselves that we have found indubitable answers to them. To teach how to live without uncertainty, and yet without being paralysed by hesitation, is perhaps the chief thing that philosophy, in our age, can still do for those who study it.»


Bertand Russell, «History of Western Philosophy», Routledge 2009, p. 2

Apontamentos fugazes 176

Sobre o mundo sem Deus

“(…) «Mas então, como é que o homem vai viver?», pergunto-lhe eu, «sem Deus e sem a vida eterna? Nesse caso, tudo será permitido, não é?» « E não sabias disso?», diz ele.”

“ (…) A mim, é Deus que me atormenta. Só isso me atormenta. O que será se Ele não existir? E se o Rakítin tiver razão e esta ideia da humanidade for artificial? Nesse caso, se Ele não existir, o homem é o dono da terra, do universo. Magnifico! Simplesmente, como será virtuoso o homem sem Deus? (…) Agora, o que mais me espanta é as pessoas viverem sem pensarem em nada disto. Vaidade! O Ivan não tem Deus. O Ivan tem a ideia. De uma dimensão diferente da minha.”

«Os irmãos Karamázov – Volume II», Fiódor Dostoiévski, Editorial Presença, pp. 309 e 311
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Recomendações 45

Ágora

Um filme muito interessante de um realizador de quem gosto.


Hypatia: “You cannot question what you believe. I must”.



Ágora de Alejandro Amenábar, trailer
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Apontamentos fugazes 157

Perfeição

Tenho uma obsessão com a perfeição. É uma obsessão que me faz mal. Mas é em momentos destes em que ponho Antony and the Johnsons a tocar, ouço o The crying light, que sei. Sei que não estou sozinha nesta obsessão e sei que a perfeição existe. E a perfeição é… perfeita. E a sua ironia é existir. E o seu riso de escárnio é existir fora de mim. E ainda assim. É tão perfeita que me traz lágrimas de felicidade.
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