Mito de Sísifo
«Os deuses
tinham condenado a Sísifo a empurrar sem descanso um rochedo até ao cume de uma
montanha, de onde a pedra caía de novo, em consequência do seu peso. Tinham
pensado, com alguma razão, que não há castigo mais terrível do que o trabalho
inútil e sem esperança.
(…)
Já todos
compreenderam que Sísifo é o herói absurdo. (…) O seu desprezo pelos deuses, o
seu ódio à morte e a sua paixão pela vida valeram-lhe esse suplício indizível,
em que o seu ser se emprega em nada terminar.
(…)
Se este mito
é trágico, é porque o seu herói é consciente (…) O operário de hoje trabalha
todos os dias da sua vida nas mesmas tarefas, e esse destino não é menos
absurdo. Mas só é trágico nos raros momentos em que ele se torna consciente.
Sísifo, proletário dos deuses, impotente e revoltado, conhece toda a extensão
da sua miserável condição: é nela que ele pensa durante a sua descida. A
clarividência que devia fazer o seu tormento consome ao mesmo tempo a sua
vitória. Não há destino que não se transcenda pelo desprezo.»
Albert
Camus, Capítulo ‘O Mito de Sísifo’, O
mito de Sísifo, trad. de Urbano Tavares Rodrigues, Editora Livros do
Brasil, pp. 125, 126, 127
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