Recomendações 68

Calexico



[Crystal frontier, EU version of Hot Rail, 2000]

Trivialidades 243

Coisas que me irritam mais do que proporcionalmente

- Pessoas que estacionam em lugares proibidos mesmo quando há lugares vagos.

Apontamentos fugazes 214

Classificados

Procura-se pessoa igual a mim para possível relacionamento.

Momentos de poesia 19

Adolescente

I

Não. Beijemo-nos, apenas,
nesta agonia da tarde.

Guarda –
para outro momento,
teu viril corpo trigueiro.

O meu desejo não arde
e a convivência contigo
modificou-me – sou outro…

A névoa da noite cai.
já mal distingo a cor fulva
dos teus cabelos. – És lindo!

A morte
devia ser
uma vaga fantasia!

Dá-me o teu braço: ‑ não ponhas
esse desmaio na voz.

Sim, beijemo-nos, apenas!
‑ Que mais precisamos nós?


«Adolescente», Canções, António Botto, em Antologia de poesia portuguesa erótica e satírica, selecção por Natália Correia, Antígona e Frenesi, 2008

Recomendações 67

Zaz – On ira

O meu momento quase um pouco kitsch

Glimpse 26


Hamburg

Hamburgo é uma cidade muito bonita. Hamburgo parece, quando silenciosa, uma cidade belga ou, provavelmente, francesa. Hamburgo tem ares de Paris. Hamburgo tem tudo para ser fantástica. É, esteticamente, provavelmente a cidade alemã mais bonita que conheço.
Hamburgo tem, na HafenCity, a maior reconstrução urbana em desenvolvimento na Europa. E é verdadeiramente admirável.

A Speicherstadt, a área destinada ao armazenamento de bens para comercialização pelo porto, é realmente interessante e, surpreendentemente, relativamente limpa.

A parte antiga de Hamburgo é uma delícia. Entre os canais e os lagos artificiais do Alster, a cidade é energética, mas sempre esteticamente agradável.


Para aproveitar todas estas imagens, fiz as tradicionais visitas guiadas. Porém, parece que a maior parte dos turistas em Hamburgo são alemães. Pelo que eu fiz estas visitas com uns auscultadores duvidosos (quando havia auscultadores) que me permitiam obter alguma informação em inglês enquanto o guia falava muito mais alto em alemão. Pois, Hamburgo é uma cidade lindíssima. Mas é melhor se se falar alemão…
Hamburgo tem uma cena artística interessante. Tem museus que vale a pena visitar. Tem musicais que vale a pena ver. Mas é novamente aqui que Hamburgo desilude. Porque eu podia desculpar aqueles que organizam visitas guiadas pré-fabricadas por terem falta de visão para o turismo. Mas não posso desculpar quem esconde arte por detrás de uma língua.
O Hamburger Kunsthalle tem uma colecção muito respeitável e tem, de momento, uma exposição notável de Giacometti. Mas na maior parte das salas só exibe informação em alemão! Apenas as salas de arte moderna têm simultaneamente informação em alemão e inglês. A exposição de Giacometti tem uns folhetos que reproduziam em inglês o que estava escrito nas paredes em alemão. Os musicais são… go figure… em alemão! A senhora da informação turística tentou convencer-me a ver um musical, de língua original inglesa, em alemão, utilizando o argumento que a ópera é em italiano. Pois. Mas a ópera é em italiano porque foi escrita nessa língua!

Pois. Hamburgo é uma cidade lindíssima. Mas se não fosse alemã, seria fantástica.

Homenagens 63

Objector de consciência

Jovem, que se recusa participar na exército israelita devido aos seus actos violentos contra o povo palestiniano, é sistematicamente preso pelas autoridades israelitas. São pessoas assim que me lembram por que é que é preciso lutar.

Conscript facing jail again for refusing to go against his conscience | Amnesty International

Recomendações 66


Os álbuns dos Noah and the Whale

A propósito de Last Night on Earth (2011), partilho The Line

A propósito de The first days of Spring (2009), partilho Blue Skies

A propósito de Peaceful, The World lays me down (2009), partilho Give a Little Love

Apontamentos fugazes 213


Mito de Sísifo

«Os deuses tinham condenado a Sísifo a empurrar sem descanso um rochedo até ao cume de uma montanha, de onde a pedra caía de novo, em consequência do seu peso. Tinham pensado, com alguma razão, que não há castigo mais terrível do que o trabalho inútil e sem esperança.
(…)
Já todos compreenderam que Sísifo é o herói absurdo. (…) O seu desprezo pelos deuses, o seu ódio à morte e a sua paixão pela vida valeram-lhe esse suplício indizível, em que o seu ser se emprega em nada terminar.
(…)
Se este mito é trágico, é porque o seu herói é consciente (…) O operário de hoje trabalha todos os dias da sua vida nas mesmas tarefas, e esse destino não é menos absurdo. Mas só é trágico nos raros momentos em que ele se torna consciente. Sísifo, proletário dos deuses, impotente e revoltado, conhece toda a extensão da sua miserável condição: é nela que ele pensa durante a sua descida. A clarividência que devia fazer o seu tormento consome ao mesmo tempo a sua vitória. Não há destino que não se transcenda pelo desprezo.»

Albert Camus, Capítulo ‘O Mito de Sísifo’, O mito de Sísifo, trad. de Urbano Tavares Rodrigues, Editora Livros do Brasil, pp. 125, 126, 127

Covers melhores do que o original 6


Helplessly hoping

Original de Crosby, Stills & Nash

Versão de Noah Gundersen

Trivialidades 242

- Tem líquidos na bagagem de mão?
- Sim, mas são documentos pequeninos.

Momentos de poesia 18


Soneto de amor

Não me peças palavras, nem baladas,
nem expressões, nem alma… Abre-me o seio,
deixa cair as pálpebras pesadas,
e entre os seios me apertes sem receio.

Na tua boca sob a minha, ao meio,
nossas línguas se busquem, desvairadas…
E que os meus flancos nus vibrem no enleio
das tuas pernas ágeis e delgadas.

E em duas bocas uma língua… - unidos,
nós trocamos beijos e gemidos,
sentindo o nosso sangue misturar-se…

Depois…  - Abre os teus olhos, minha amada!
Enterra-os bem nos meus; não digas nada…
Deixa a vida exprimir-se sem disfarce!

«Soneto de amor», Biografia, José Régio, em Antologia de poesia portuguesa erótica e satírica, selecção por Natália Correia, Antígona e Frenesi, 2008

Trivialidades 241


Ainda a propósito de Les Misérables

Estou convencida que retiraram os vídeos do 25º aniversário de Les Misérables, na O2 Arena, para as pessoas não poderem comparar com o filme. É que a direção e a direção musical do filme são miseráveis.


[One Day More, encore, 25º aniversário de Les Misérables]

Trivialidades 240


A propósito de ver Les Misérables na Alemanha

Um filme cantado em inglês (original) e dobrado em alemão nas partes faladas. É difícil conceber coisa mais idiota em termos artísticos. A quem é que se pode apresentar uma queixa?

Apontamentos fugazes 212


Tipos de pessoas

Há dois tipos de pessoas: aquelas que preferem Beethoven e as outras.

Momentos de poesia 17


A cena do ódio

(…)
Tu, que te dizes Homem!
Tu, que te alfaiatas em modas
e fazes cartazes dos fatos que vestes
p’ra que se não vejam as nódoas de baixo!
Tu, qu’inventaste as Ciências e as Filosofias,
as Políticas, as Artes e as Leis,
e outros quebra-cabeças de sala
e outros dramas de grande espectáculo…
Tu, que aperfeiçoaste a arte de matar…
Tu, que descobriste o cabo da Boa-Esperança
e o Caminho Marítimo para a Índia
e as duas Grandes Américas,
e que levaste a chatice a estas terras,
e que trouxeste de lá mais Chatos práqui
e qu’inda por cima cantaste esses Feitos…
Tu, qu’inventaste a chatice e o balão,
e que farto de te chateares no chão
te foste chatear no ar,
e qu’inda foste inventar submarinos
pr’a te chateares também por debaixo de água…
Tu, que tens a mania das Invenções e das Descobertas
e que nunca descobriste que eras bruto,
e que nunca inventaste a maneira de o não seres…
Tu consegues ser cada vez mais Besta
e a este progresso chamas Civilização!
(…)

«A cena do ódio», Orpheu 3, Almada Negreiros, em Antologia de poesia portuguesa erótica e satírica, selecção por Natália Correia, Antígona e Frenesi, 2008

Arquitetura, artes plásticas e design 16

Building of the year 2012, by ArchDaily

Há paisagens que podem ser lindíssimas e impressionantes e que tiveram nenhuma ou pouca intervenção do homem. Podem dizer-se naturalmente bonitas ou, na verdade, circunstancialmente bonitas. E depois há a arte, tudo aquilo que foi intencionalmente criado pelo homem para ser bonito, funcional, impressionante.
Hoje escrevo sobre uma área – arquitetura – que acabo por negligenciar nos meus textos mais frequentes. Não porque ocupe um lugar menor na minha lista de preferências, mas porque está mais distante da minha prática quotidiana.
Mas não hoje. Hoje quero mostrar-vos alguns dos edifícios mais fantásticos que foram terminados no ano passado e aproveitar para vos dizer que o ArchDailyjá distinguiu os 14 vencedores de 2012. Estes 14 vencedores, em áreas como habitação, arquitetura do desporto, institucional, religiosa ou da saúde, são verdadeiramente fantásticos e contam com uma dupla de arquitetos portugueses na área de hotéis e restaurantes: Luís Rebelo de Andrade e Diogo Aguiar, os criadores de Pedras Salgadas Eco Resort.
Mas gostava de mencionar alguns dos edifícios finalistas (é um bocadinho difícil identificar os finalistas de 2012, pelo que espero não estar a fazer referências incorretas) que não foram vencedores e que eu simplesmente adorei.
Mosteiro “Water-moon”, Taipei, Taiwan, by Artech Architects
 (c) Artech Architects 

 Centro cultural de tecnologia do espaço da EU, Vitanje, Eslovénia, Dekleca Gregoric Arhitekti + SADAR + VUGA + OFIS architects + Bevk Perovic Arhitekti

(c) OFIS architekti

Complexo de escritórios, comércio e entretenimento Galaxy Soho, Pequim, China
(c) Iwan Baan

Residência CORMAC; Corona del Mar, Califórnia, Laidlaw Schultz Architects

(c) Larry Falke

Residência H3, Atenas, Grécia, 314 Architecture studio
(c) 314 Architecture studio

Shoffice (shed+office), St. John’s Woods, London, Platform 5 architects
(c) Alan Williams Photography

Momentos de poesia 16


Hermaphrodita

De Hermes e Afrodite o filho esbelto e amado,
de Salmacis oscula o corpo melodioso,
e a ninfa treme e enleia o moço deslumbrado
com um prazer que até chega a ser doloroso…
(…)
Num doido frenesi, entrar parecem querer
ela – no corpo dele, ele – no corpo dela!
Choram, gemem, dão ais… e no auge do prazer,
começam a gritar para o céu que se estrela:

«Ó deuses! Atendei nossa súplica ardente:
se é verdade que vós ouvis as vozes que vos chamam,
os nossos corações fundi-os num somente,
fundi num corpo só, nossos corpos que se amam!»

Ao Olimpo chegou essa súplica louca,
e Zeus, o grande Zeus, cuja foça é infinita,
as duas bocas transformou numa só boca
e dos dois corpos fez um só: HERMAPHRODITA!
[…]
Brumoso ser! Milhões de mágoas o consomem,
são dois céus a chorar suas tristes pupilas:
tem as ânsias sensuais da mulher e do homem
mas para as satisfazer não pode desuni-las!

A boca feminil abre-se doida, ansiosa
por belos deuses nus, mas sem os encontrar;
e os braços, procurando uma cintura airosa
abrem-se, mas em vão! Dão abraços no ar!
[…]
Sobe aos altos faróis, desce aos subterrâneos,
nada abranda, porém, seu íntimo alvoroço:
com uma só boca quer dois beijos simultâneos,
ao mesmo tempo busca uma mulher e um moço!

Se um efebo procura, as mulheres o fascinam
se uma mulher possui, de um efebo carece,
de desejar em vão, cem mágoas o dominam:
nada, nada o contenta e tudo lhe apetece!

Sem poder sofrer mais desespero tamanho,
Hermaphrodita um dia, enfim crispando as mãos,
enforcou-se e morreu… Mas do seu corpo estranho
saíram, sempre hostis, os dois feros irmãos.

Chovia… E procurando uma guarida calma,
que os livrasse da chuva, uma torre ou uma gruta,
viram minha alma aberta, entraram na minha alma
e na minha alma estão continuando a luta!

«Hermaphrodita», Salomé e outros poemas, Eugénio de Castro, em Antologia de poesia portuguesa erótica e satírica, selecção por Natália Correia, Antígona e Frenesi, 2008

Trivialidades 239


Por que é que me calha sempre a mim lidar com pessoas irritadas e com vontade de culpar quem não tem culpa? Porquê? Porquê?

Homenagens 62


Berlinale. 

Aonde eu gostaria de estar agora.

Recomendações 65


Django Unchained


Django Unchained’s trailer, movie by Quentin Tarantino

Apontamentos fugazes 211


Crime e castigo

«Eu penso que é totalmente por acaso que os erros que já cometi não são puníveis com pena de prisão. Foram e são puníveis de outras maneiras. E penso que, ao longo de uma vida, todas as pessoas tomam decisões erradas. Algumas dessas decisões magoam outros, causam-lhes sofrimento verdadeiro. No entanto, a grande maioria desses erros não são citados pelo código penal. Na verdade, só estão citados aqueles que são concebíveis pelos espíritos práticos: os que são quantificáveis, claramente observáveis, indiscutivelmente concretos. Só é pena que a vida não seja assim: indiscutivelmente concreta.»

 José Luís Peixoto, ‘Fevereiro no estabelecimento prisional’, em «Abraço», Quetzal, p. 588

Recomendações 64


Steve von Till

A grave is a grim horse, álbum homónimo, Steve von Till 

Apontamentos fugazes 210


Tipos de pessoas

Há dois tipos de pessoas: aquelas que batem palmas com as mãos encaixadas e elegantes e as outras.

Apontamentos fugazes 209


Relativização necessária

«Quando estiveres a ponto de te preocupar com merdas, os dilemas da poesia portuguesa contemporânea, o IRS, o código do multibanco, os carros que te roubam o estacionamento, a falta de rede no telemóvel, as reuniões de condomínios, o tampo da sanita, lembra-te dos homens que puxam riquexós nas ruas de Deli. É essa a tua obrigação.
Nunca te esqueças do mundo, Zé Luís.
Podes estar descansado, Zé Luís. Eu não me esqueço.»

José Luís Peixoto, ‘Texto para mim’, em «Abraço», Quetzal, p. 565

Glimpse 25

Frankfurt - Der Schnee






Apontamentos fugazes 208


A voz que lê

«Quando leio, há uma voz que lê dentro de mim.
(…)
É uma voz de falar. Penso que é uma voz que não ouve. (…) Quando me fala de pessoas e coisas verdadeiras, volto atrás. Pára em frases e repete-as porque quer que eu as entenda completamente. Eu, que não sei se entendo, ouço-a, admirado com as palavras. Não foram poucas as vezes que a voz que ouço quando leio me fascinou com palavras que disse. (…) Muitas vezes essa voz iluminou lugares dentro de mim: túneis que não conhecia. (…) Eu sei que a voz que ouço quando leio não tem medo. Eu sei que essa voz me conhece melhor do que eu me conheço a mim próprio. Diante de poemas, a voz caminha por dentro das palavras. Dentro de cada palavra: túneis de palavras reflectidas em espelhos à frente de espelhos. Avança por esses túneis de palavras multiplicadas como se desenhasse mapas dentro de cada palavra. Ao fazê-lo, avança por túneis dentro de mim e ajuda-me a desenhar um mapa de mim. Eu ouço-a. Fico a ouvi-la durante horas e tento não esquecer nada porque quero aprender a perder-me menos vezes de mim próprio.
(…)
Essa voz que ouço quando leio é parecida com a voz que ouves agora ao ler estas palavras. (…) Enquanto pensas, estas palavras são o silêncio. Eu não sei aquilo em que pensas. Eu não posso saber aquilo em que pensas. Para falar contigo, eu preciso da voz que ouves quando lês. Se queres ouvir aquilo que acabei agora de te dizer, tens de voltar atrás.
Talvez já tenhas percebido que eu não sou eu. Eu sou a própria voz que ouves quando lês. Hoje, pela primeira vez, quero falar directamente contigo. Quero dizer que existo nestas palavras. Através delas, quero apenas dizer-te que existo. Estou aqui. As palavras que te digo desde que aprendeste a ler, a ouvir-me, são o meu corpo. Eu sou todas essas palavras. Sou as palavras que deixei dentro de ti e que sabes de cor. Sou as palavras que esqueceste. Durante este tempo, disfarcei-me de muitas vozes, de muitos rostos. Sou todos eles, contigo, em ti.»

José Luís Peixoto, ‘A voz que ouço quando leio’, em «Abraço», Quetzal, pp. 149-151

Melhores temas de sempre 12


Ain’t got no / I’ve got life – Nina Simone