Obama’s speech in CairoPode ser um discurso cheio de Deus, de deuses, de religião, de religiões. Pode ser um discurso que, como já li, não faz a verdadeira separação entre o Estado e a religião. Pode ser um discurso cheio de citações de textos religiosos.
Podia ser um discurso falhado. Mas não foi.
Foi um discurso brilhante.O que o tornou um discurso brilhante (claro, é uma opinião pessoal) foram as regras básicas do discurso e uma capacidade notável de as pôr em prática, de escolher as palavras certas, as frases apelativas, a retórica apropriada.
Este tornou-se um discurso muito esperado, o discurso “decisivo”. Não podia ser um discurso agressivo, intolerante, mas também não podia ser cobarde, escamoteado. E o Obama e a sua equipa conseguiram um equilíbrio admirável no texto.
Um discurso serve para transmitir ideias. Mas só produz efeitos se a audiência tiver interesse na mensagem. Por isso é que Obama citou com frequência textos religiosos: porque ele precisava de conseguir o interesse da audiência na mensagem. E a audiência era composta fundamentalmente de pessoas religiosas. Quer me agrade ou não, quer partilhe os princípios ou não, eu não vou falar dos glaciares às pessoas do Sahara quando quero que elas embarquem comigo numa viagem por um objectivo comum. Vou falar-lhe dos interesses e preocupações comuns. Vou tentar criar afinidade.
Acho que todos temos que nos lembrar que Obama estava em território hostil. Hostil porque, depois dos últimos anos, é demasiado fácil criticar os EUA. Hostil por causa da relação dos EUA e de Israel. Hostil pela dificuldade que é limpar uma imagem.
E, na minha opinião, Obama conseguiu ultrapassar isso sem abdicar dos pontos fundamentais. Não é por suportar a causa de um Estado palestiniano que deixou de condenar os ataques suicidas. Não é porque o que aconteceu a seguir foi errado, que deixou de relembrar a tragédia do 11 de Setembro. E o fundamental aqui foi (e será sempre) o respeito pelos direitos humanos. E ele conseguiu transmitir isso, seja na maneira subtil como introduziu o respeito pela escolha, seja no modo como falou do direito a viver sem ter um alvo na testa.
Eu sei. Eu sei. Tenho uma simpatia grande por ele. E pelo rapaz que escreve os discursos, se bem que dizem que o próprio Obama trabalhou bastante neste. Mas leiam o discurso. Leiam-no, tendo em mente o objectivo, tendo em mente o passado pesado que os EUA têm em relação ao mundo árabe. Leiam-no e deixem-se inebriar se for esse o caso. Eu li-o assim e se o Obama me aparecesse aqui enquanto o lia e me dissesse que o mundo ia mesmo ser um mundo melhor, eu achava que o Alberto Caeiro estava errado e que feliz seria eu e todos os que vivem a vida a querer inventar a máquina de fazer felicidade.
Uns excertos
«Of course, recognising our common humanity is only the beginning of our task. Words alone cannot meet the needs of our people. These needs will be met only if we act boldly in the years ahead; and if we understand that the challenges we face are shared, and our failure to meet them will hurt us all.
For we have learned from recent experience that when a financial system weakens in one country, prosperity is hurt everywhere. When a new flu infects one human being, all are at risk. When one nation pursues a nuclear weapon, the risk of nuclear attack rises for all nations. When violent extremists operate in one stretch of mountains, people are endangered across an ocean. And when innocents in Bosnia and Darfur are slaughtered, that is a stain on our collective conscience. That is what it means to share this world in the 21st century. That is the responsibility we have to one another as human beings.
This is a difficult responsibility to embrace. For human history has often been a record of nations and tribes subjugating one another to serve their own interests. Yet in this new age, such attitudes are self-defeating. Given our interdependence, any world order that elevates one nation or group of people over another will inevitably fail. So whatever we think of the past, we must not be prisoners of it. Our problems must be dealt with through partnership; progress must be shared.
That does not mean we should ignore sources of tension. Indeed, it suggests the opposite: we must face these tensions squarely.
(…)
The issues that I have described will not be easy to address. But we have a responsibility to join together on behalf of the world we seek – a world where extremists no longer threaten our people, and American troops have come home; a world where Israelis and Palestinians are each secure in a state of their own, and nuclear energy is used for peaceful purposes; a world where governments serve their citizens, and the rights of all God's children are respected. Those are mutual interests. That is the world we seek. But we can only achieve it together.
I know there are many – Muslim and non-Muslim – who question whether we can forge this new beginning. Some are eager to stoke the flames of division, and to stand in the way of progress. Some suggest that it isn't worth the effort – that we are fated to disagree, and civilisations are doomed to clash. Many more are simply skeptical that real change can occur. There is so much fear, so much mistrust. But if we choose to be bound by the past, we will never move forward. And I want to particularly say this to young people of every faith, in every country – you, more than anyone, have the ability to remake this world.
All of us share this world for but a brief moment in time. The question is whether we spend that time focused on what pushes us apart, or whether we commit ourselves to an effort – a sustained effort _ to find common ground, to focus on the future we seek for our children, and to respect the dignity of all human beings.
It is easier to start wars than to end them. It is easier to blame others than to look inward; to see what is different about someone than to find the things we share. But we should choose the right path, not just the easy path. There is also one rule that lies at the heart of every religion – that we do unto others as we would have them do unto us. This truth transcends nations and peoples – a belief that isn't new; that isn't black or white or brown; that isn't Christian, or Muslim or Jew. It's a belief that pulsed in the cradle of civilisation, and that still beats in the heart of billions. It's a faith in other people, and it's what brought me here today.
We have the power to make the world we seek, but only if we have the courage to make a new beginning, keeping in mind what has been written.»
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